A formação de Belém



"Não deixa de haver interesse em saber-se como se formou a nossa hoje grande capital, que, afastando-se da regra geral, quanto mais velha fica, mais moça e formosa se nos apresenta.
Fundada Belém, a primeira praça aberta na mata frondosa foi a da Matriz, aquela que chamamos atualmente de Dom Frei Caetano Brandão, antigo Largo da Sé, que ocupava o centro do local que Castelo Branco fez povoar. O Largo era separado do centro do matagal por um extenso igarapé que, partindo do Ver-o-Peso, dava longa volta paralela à Avenida São José, tomando daí o rumo do Arsenal de Marinha, junto ao qual, nos fundos, desaguava para o Guajará, sendo essa parte do igarapé – assim cremos – hoje conhecido pelo nome de Igarapé do Ladrão.
Pouco a pouco se foram abrindo as vias públicas que formam o bairro da Cidade Velha: ruas Norte, Espírito Santo, Cavalleiros, São Boaventura, Aljube, Alfama, Longa, São João e outras; travessas Rosa, Atalaia, Água das Flores, Barroca e Ferreiros; largos do Carmo, Palácio, São João, São José e Arsenal; estrada Mongubeira, Calçada do Colégio e estrada de São José.
Um longo caminho pela mata a dentro ligava o Arsenal de Marinha ao arraial de Nazaré onde existia um portão sob a fiscalização de um guarda. Outro caminho tortuoso ligava o largo da Campina (atual Praça da República) ao engenho de Theodureto Soares. Na margem deste caminho, no local da Praça de Nazareth, residia, em meados de 1700, um homem de cor, chamado Plácido, em cuja barraca festejou-se primitivamente a imagem de N.S. de Nazareth, e que deu origem à nossa grande festa anual, e que mais tarde foi causa também para a abertura do arraial de 1774. Além desses dois caminhos, havia outros, que serviam para as comunicações do povo, pois até fins do século XVIII a edificação era rara no largo da Campina e arredores. Vagarosamente foi ela andando para fora da cidade velha, marginando, porém, sempre o Guajará até ao Convento Santo Antônio.
O Reduto de São José ocupava o sítio em que foram instaladas mais tarde as oficinas da Companhia do Amazonas; foi ele construído em 1771 ficava no flanco do convento de Santo Antônio. Fez-se um reduto de faxina à borda d´água, com a berma circuitada de paliçada, e montaram-se aí quatro canhões de grosso calibre. O terreno foi previamente estaqueado. Esta construção teve em vista completar a resistência do Forte de S. Pedro Nolasco que ficava aos fundos do convento das Mercês, em defesa da cidade. Além destes fortes, havia a Fortaleza de N.S. das Mercês, em defesa da cidade. Além destes fortes, havia a Fortaleza de N.S. das Mercês da Barra (Fortaleza da Barra) feita em 1685, num banco de pedra e que ainda existe transforada em entreposto federal de inflamáveis.
Em meados de 1793 o governador Francisco de Souza Coutinho mandou construir entre o Reduto de S. José e o Forte de S. Pedro Nolasco uma sólida bateria, sobre a praia, com um lado para o mar e o outro para a terra, e nela montou cinco canhões de grosso calibre e outro de menores. Em 1807 foram unidas as fortificações (S. José ao Santo Antônio) e anos depois, completamente arruinadas, foram demolidas, para serem levadas até ao mar as travessas da Estrela (Ferreira Penna) e Piedade, sendo então feitos melhoramentos que ali se vêm. Desses terrenos a Companhia do Amazonas tomou conta e neles instalou suas oficinas, sendo os mesmos cedidos pelo governo por aforamento. Depois, apareceram a Rua da Cadeia, a do Açougue, a das Flores, travessas do Pelourinho, de S. Matheus, do Passinho, das Mercês, do Açougue, etc. Em 1801 foi construído quase à Rua das Flores, além do largo da Campina, um chafariz de pedra com duas bicas, e ao largo que o circunda (em continuação da travessa da Piedade) deram o nome de largo do Chafariz, como ainda é conhecido. (Neste largo estiveram as montanhas russas). Para chegar a esse chafariz descia-se por duas escadas de pedra, de cinco degraus.
Em 1886 ainda existiam naquele local as quatro paredes desse chafariz que reais serviços prestou aos moradores ali, e na face inferior de uma das paredes estava gravada a data de 1802, quando, talvez, fosse ele inaugurado.
Posteriormente, foram demolidas pela câmara. Em 1841 foi aberto, entre o Reduto S. José e o igarapé Reduto, um canal que desse escoamento às águas da cidade e pudesse ser navegado. Esse igarapé cortava Belém e ia até muito longe. Em 1851 o governo contratou com Antônio José de Miranda a transformação daquele igarapé numa doca para abrigo de pequenas canoas, o que se realizou em 1852. Somente em 1851 começou a ser aterrado e nivelado o largo do Palácio, para dar esgoto às suas águas.
A lei que autorizou esses serviço (n. 174 de 3 de dezembro de 1850) mandou também que fossem macadamizados os seus passeios, colocando-se bancos e arborizando a praça. Nos anos seguintes foram votadas verbas para esses serviço, bem como para o aterro e nivelamento da Praça República. Ainda nos anos de 1859 e 1860 vemos verbas nas leis números 351 e 494 para essas despesas, assim como nos anos de 1854 a 1872 para desobstruir as docas do reduto e do largo de Palácio. Em 1872 a assembleia votou a lei n. 729, autorizando o governo a mandar abrir as docas no antigo curro da rua S. Boaventura e no igarapé das Almas (hoje Souza Franco), o que não se realizou. A esse tempo, já existia a calha da travessa do Cano, entre as ruas S. Boaventura e Dr. Assis, que recebe as águas das valas da estrada Almirante Tamandaré e na qual bem como no igarapé S. José (largo do Ladrão) foi, naquele ano, colocada a comporta ou ladrão que ainda se vê, e que deu o nome do dito igarapé; nas docas Reduto e Ver-o-Peso, existiam outras que foram retiradas ao depois, por conveniência. Em 1871 foi a Câmara Municipal de Belém autorizada pela lei n. 695 a concluir o arruamento nos terrenos que compunham a sua légua patrimonial, à margem esquerda da E.F. de Bragança, no sentido de aumentar a edificação da cidade, o que levou a efeito pouco depois. Aquele bairro chamado Marco da Légua, deu grande impulso a linha de bonds estabelecida em 1872, nos termos da lei n. 665, de 31 de outubro de 1870, e contratado entre o governo e a firma concessionária daquele serviço, Bueno & Cia, em 6 de novembro de 1871. A esse tempo já existia o largo de S. Braz (Floriano Peixoto), que foi aberto em 1850, e as travessas que dele vem até ao largo de Nazareth (Justo Chermont), todos com raras casas ainda".
ANNUARIO de Belém em comemoração do seu tricentenário 1616-1916. 1915, p. 18-19.


 
 
Doca do Reduto.
Álbum do Pará em 1899.
Acervo da Biblioteca Pública Arthur Vianna
 

 


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