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Mostrando postagens de setembro, 2018

A cozinha paraense

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"Então, a cozinha amazônica – especialmente a paraense – se destaca pela autenticidade, pela sua índole nativa, pelo fato de os seus elementos e condimentos serem autóctone, e por conta do que tem de mais selvagem: o picante e os aromas. E mais: ela é quase tudo o que nos resta de nossas origens tribais. Para que seja uma cozinha de difícil exportação (a não ser em condições especiais), pela dificuldade de conseguir as condições ideais que pudessem garantir a fidelidade, a propriedade do paladar autêntico. Só quem já comeu um autêntico pato ao tucupi paraense pode entender o quanto fica longe, apagada e mal falsificada, a contrafação que existe em alguns restaurantes. E, ao mesmo tempo, explica porque é realmente difícil encontrar restaurante ou mesmo pratos amazônicos longe de lá. A cozinha paraense, ou melhor, a de Belém, começa no mercado, na doca do Ver-o-Peso. A felicidade do estômago, diz Osvaldo Orico, “não está apenas na hora em que os pratos começam a ser s

Um verdadeiro dilúvio

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"Esta madrugada foi, até o presente, a pior desta viagem e acredito que dificilmente passarei outra igual. Acordei às 2 hora da manhã ensopado de chuva. Caiu verdadeiro dilúvio, com vento e trovoada, molhando-nos em segundos. Tive de me levantar, pois de nada valeria ficar deitado numa rede molhada, com a coberta encharcada, chuva caindo por todos os lados. Nosso fogo apagou depressa. A solução escolhida foi acocorarmo-nos embaixo de algumas folhas de inajá e, de cócoras, esperar que as horas se escoassem. Assim esperamos até o dia amanhecer, 3 horas seguidas sob forte chuva e vento. Ao amanhecer, nossa pele estava enrugada e branca, como se tivéssemos permanecido todo esse tempo dentro d´água". José Cândido M. Carvalho (1914-1994). Notas de viagem ao rio Negro. Publicações Avulsas do Museu Nacional , Rio de Janeiro, n. 9, p. 61, 1952. Folhas da palmeira Inajá ( Maximiliana regia) . C. Fr. von Martius. Historia Naturalis Palmarum 1823-1850

O lugar sagrado, onde todas as forças se reúnem harmoniosamente, segundo Martius

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Pará 16 de agosto de 1819. Como me sinto feliz aqui, como chego a compreender a fundo muito daquilo que até agora era inacessível! O lugar sagrado, onde todas as forças se reúnem harmoniosamente e ressoam como canto triunfal, amadurece sensações e pensamentos. Parece-me compreender melhor o que é o historiador da natureza. Diariamente lanço-me na meditação do grande e indizível quadro da natureza e, embora seja fora do meu alcance compreender sua finalidade divina, ele me enche de deliciosas emoções – São três horas da madrugada, levanto-me da rede porque não consigo mais dormir de excitação; abro a venezianas e olho para a noite escura e solene. Magníficas brilham as estrelas, e o rio resplandece com o reflexo da lua poente. Como tudo é quieto e misterioso em torno de mim! Ando com o lampião para a fresca varanda e contemplo os meus queridos amigos, as árvores e arbustos em redor da casa. Alguns estão dormindo com as folhas bem dobradas, outros, porém que descansam de dia, elev

Crepúsculo da tarde

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"Há um recolhimento religioso em toda a natureza. O sol se esconde, entre nuvens de ouro. As águas que rolam na correnteza não têm mais a cor de barro. Sob os reflexos do fim da tarde, tomaram uns tons que maravilhosamente, semelham prata velha. O rio parece um imensurável espelho, que transmuda, de instante a instante, em nuances multiformes e policrônicos, as suas escamas e maretas... Pelos ares, marrecas e periquitos, em algazarra aos bandos. A mataria, nas beiras, tem os cimos das suas copas doiradas. Vem da floresta um rumorejar surdo que mais aumenta agora, para, daqui a instantes, diminuir de intensidade. O gralhar mais agudo de algum pássaro em luta zarpeia os espaços e responde, muito distante, no eco sonoro... Em seguida, logo, a solidão que, como um sudário, envolve a grande paisagem do sol morto. A semi-penumbra desfaz-se a pouco e pouco, sem a gente aperceber-se. Tudo está envolto em sombras. Já não mais se descobrem as árvores grandiosas. As