J. B. von Spix & C. F. P. von Martius e a chegada em Santa Maria de Belém do Grão-Pará

"[...]. Quando o sol do dia 25 de julho nasceu no claro horizonte, iluminou em torno de nós um labirinto de ilhas grandes e pequenas, e, no fundo do painel, a margem do continente e da fronteira ilha de Marajó. Ostentava-se alta, verde, pujante, a mata em volta, juvenil e tranquila, como se acabasse justamente de surgir das águas criadoras. Peixes em cardumes evoluíam rápidos na correnteza, e aves de variada plumagem, pousadas nos galhos floridos, pareciam os únicos habitantes daquela grandiosa solidão, colunas de fumaça azul, elevando-se do seio da mata virente, significavam-nos a existência dos senhores da terra no seu feliz retiro. Jamais se nos apresentava tão majestosa a força criadora da terra, como aqui, onde em exuberante plenitude o mundo das plantas brota de todos os lados, fertilizando pelos raios do sol equatorial, acima das águas fecundantes. Este cenário da força criadora do planeta renovava-se continuamente aos nossos olhos, quanto mais nos aproximávamos da cidade. Como a preamar não nos favorecesse muito, de novo ancoramos, para não sermos atirados sobre algum dos diversos bancos de areia do rio. Cerca de meio-dia, chegamos à vista de uma pequena fortaleza sita à margem do rio, o forte da Serra; e, logo depois, apareceu a cidade do Pará, com sua casaria asseada, a Catedral e o palácio, por entre o verde escuro dos cacauzeiros e a orla de resplandecente verde de inúmeras ilhas [...].
Assim estávamos, pois, afinal depois de tantos perigos e tormentos, no longamente almejado Pará. Com sereno contentamento, considerávamos o passado; a longínqua meta estava alcançada; desde o trópico de Capricórnio até ao equador, havíamos percorrido o opulento país, e trazíamos a mente repleta de maravilhosos aspectos. Agora nos encontrávamos no equador, no lugar do equilíbrio da mais bela concordância de todas as potências terrestres; e, como as mais fortes alegrias do homem são as do mundo das ideias e das percepções, assim estávamos repassados do gozo com as indizíveis sensações, que a grandiosidade do lugar em nós despertava.
Quando pela primeira vez acordamos aqui, abrimos o postigo do nosso quarto; resplandecia o sol, como em triunfo, no azul profundo do céu; o campo estendia-se cintilante de orvalho; e o sussurro das palmeiras, agitadas pela aragem, acompanhava o hosana, entoado pelo canto de bandos de pássaros. Comparticipamos, então, da soberba festa da natureza, enlevados, fortalecidos, como que sagrados para mais nobres aspirações e mais altos gozos!" ( J. B. von Spix (1781-1826) & C. F. P. von Martius (1794-1868). Viagem pelo Brasil. 1938, v. 2, p. 558-559).
 
 
 
 
Santa Maria de Belém do Grão-Pará.
Victor Marie Felix Danvin, s.d.
 
 
 
 
J. B. von Spix ( (1781-1826) ; C. F. P. von Martius (1794-1868).
 
 
 

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