Um lago de vitórias régias


"Saí de Tefé às 10 horas da manhã, atravessei a lagoa em duas horas de canoa, e entrei sob as árvores no furo (varadouro) ou canal de Caiçara que liga, em tempos de enchente, o Solimões ao lago de Tefé. A lagoa estava inteiramente imóvel. O sol, em todo seu esplendor, lançava raios de ouro sobre a superfície límpida, cujo tom escuro fazia as vezes do estanho em nossos espelhos. Produzia um reflexo deslumbrante. Tivemos a sorte de encontrar refúgio nas sombras frescas de um igapó (floresta inundada), de lá saindo perto das duas e meia da tarde. No começo as águas são estagnadas, até chegar a um lago de forma oval, atravancado de juncos, nenúfares, ervas e vitórias régias. Ao sair do lago, é preciso enfrentar uma correnteza mais ou menos forte em função do nível das águas que vêm do Solimões. Esse furo é evidentemente testemunho da época longínqua em que o Amazonas aqui se unia ao lago de Tefé, no ponto em que ainda existe o pequeno lago. [...]. Eu tinha comigo apenas um remador, um índio cristão, casado, que tinha sido meu aluno, e devia, ao mesmo tempo, servir-me como sacristão. Depois de ter subido durante três horas a margem direita do Solimões, parei em Caiçara para ali passar a noite. A hospitalidade brasileira é proverbial. Onde não existe nem hotel, nem restaurante, todas as casas são suscetíveis de servir como hotel e como restaurante, com a vantagem apreciável de não ter que pagar nenhuma conta. É uma troca baseada na reciprocidade. Hodie mihi, cras tibi. (Hoje a mim, amanhã a ti). Pe. Constant Tastevin (1880-1962). In: FAULHABER, Priscila; MONSERRAT, Ruth. Tastevin e a etnografia indígena: coletânea de traduções de textos produzidos em Tefé (AM). 2008, p. 41.


Victoria regia.
Lithograph by Ernst Heyn, 1892

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