Reflexões: Hora íntima.



 
Quando o tédio vier, nas noites indormidas,
terei de preencher o vazio das horas.
Terei que dar sentido aos momentos estéreis
para não mergulhar no vácuo do não-ser.
 
Deverei ponderar sobre o que não criei,
sobre o desvalimento da presença inútil,
sobre a palavra dita em momento indevido
e sobre a negação de um gesto ou de um olhar.
 
Deverei meditar sobre o quanto não fiz,
sobre os passos levados pelos descaminhos,
sobre a inglória omissão a um apelo de amor,
sobre a invasão da dor na hora inoportuna.
 
Deverei resolver fracassos renegados,
assumir erro e culpa, acordar sofrimentos
que causei, ao vencer talvez espezinhando
impunemente ou não outras almas em ruínas.
 
Deverei descansar minha própria aparência,
surgir diante de mim como quem se confessa,
como quem se revela, em face da verdade,
para viver na luz, para dormir em paz.
 
Dulcinéa Paraense
 
Extraído de: PARAENSE, Dulcinéa. Dulcinéa Paraense a flor da pele. Belém: SECULT, 2011.
 
 
 
 


Pintura de  Francis John Wyburd (1826-1893).
 

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