O canto do Uirapuru e as aves na floresta

        [...]. Eis que chegavam porém uma revoada heterogênea, saís, japins, rouxinóis, teu-téus, pipiras, anus, bicudos, coleiros, patativas, bem-te-vis, canários-da-terra, tangarás, maria-já-é-dia, anambés, arapongas, ferreirinhos, urutaís, andorinhas, tanguruparás. Acamparam na mistura de retirantes flagelados, em desordem, cada qual procurando uma nesga de chão desocupado. A fauna presente, em virtude do zunzum inartístico, olhou repreensiva aquela multidão de pés-rapado. Nesse interim baixou outra revoada de surucuás, arirambas, pica-paus, cujubins, aracuans, inhambus, macucauas, frangos-d´água, maçaricos, piaçocas, garças, arapapás, colhereiras, cararás, guarás, maguaris, jaburus, tuiuiús, gaivotas, mergulhões. Arrearam com o rumor seco do fechar dum grande leque.

        Foi quando o alto das clareiras se encheram de frêmitos, lembrando minúsculos aviões. Aviões que não excediam de sete a vinte e um centímetros, meio verdes, meio dourados, cujas asas, em trepidante agitação, ninguém via. Adivinhavam-se. Deslocando-se de bicos em riste e de novo chumbando-se no ar, embora o delírio eletrônico das asas continuasse o movimento, pareciam numerosa flotilha de aeroplanos egressa de alguma Liliput. Cada um daqueles corpos soltos no espaço guardava o condão encantado de estar, ora fixo no éter, ora móvel, como se os ventos e a atração da terra não exercesse influências sobre eles, pois subiam, desciam, transferindo-se à esquerda, à direita, alheios em suma, a todas as leis físicas. Eram os beija-flores. Sobretudo em volta do florido pau-d´árco em que trinava o uirapuru, eles, vedetas possivelmente de alguma divindade silvestre, escutavam o passarinho cantar.


FONTE:

 MORAIS, Raimundo. Os Igaraúnas. São Paulo: Roswitha Kempf, 1985. p. 132-133.


Beija-flores
Desenho de Ernst Haeckel
(1834-1919)
                                                      
        

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