O crepúsculo na mata


"O tempo estava agora firme e seco, e as águas do rio baixaram rapidamente - quinze centímetros em vinte e quatro horas. Nesse lugar isolado e remoto assisti pela primeira vez - e talvez única - à atoarda feita pelos animais ao crepúsculo, que Humboldt descreveu ter testemunhado perto das nascentes do Orinoco mas que não é comum nas margens de rios mais caudalosos. A zoeira começou ao cair de uma tarde de calor sufocante, depois que o sol se escondeu por trás das árvores e o céu se apresentava de um azul intenso e profundo. Dois bandos de macacos - uivadores, um perto de nosso barco e o outro a cerca de uma braça de distância, fizeram ecoar pela mata seus apavorantes gritos. Dezenas de papagaios de mistura com araraúnas, das quais eu tentava conseguir alguns espécimes, começaram a passar em ondas no alto do céu, seus diferentes tipos de gritos e pios compondo uma tremenda dissonância. Juntando-se a essa algaravia, vibrava no ar o canto de estranhas cigarras, algumas de grande tamanho, as quais, empoleiradas no alto das árvores ao redor da nossa pequena enseada, faziam soar suas notas agudas e estridulantes. Seu canto começava com as habituais notas ásperas e rascantes características da sua espécie, as quais se iam tornando gradativamente mais agudas até terminarem num som contínuo e alto semelhante ao apito de uma locomotiva. Uma meia-dúzia dessas extraordinárias cantoras da selva representavam uma ponderável contribuição para a sinfonia noturna. Eu já tinha visto essa espécie de cigarra no Pará, mas lá era mais rara. [...]. A zoeira feita pela bicharada durou pouco, o céu logo perdeu o seu tom de azul profundo e a noite desceu. Começou então o coaxar dos sapos, os quais, acompanhados pelo canto melancólico de um bacurau, continuaram com a sua melopéia pela noite a dentro".  Henry Walter Bates (1825-1892). Um naturalista no rio Amazonas. 1979. p. 185.


Ararauna.
 Edward Lear (1812-1888). Illustrations of the Family of the Psittacidae or parrots. 1832.

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