Amazônia que eu vi: uma orquestra de mil vozes de aves
"[...]. Esforçamo-nos de romper uma passagem por entre as hastes de arumá (Marantha) e juncos mais altos que um homem.
Ainda não vemos nada, mas já uma orquestra de mil vozes de aves que vamos ouvindo cada vez mais distintamente à medida que avançamos é prenúncio de que não voltaremos sem resultado da nossa excursão. Pouco a pouco o entrelaçado da vegetação de brejo vai ficando menos denso e assim veio o momento onde as consequências de cada passo precisam ser cuidadosamente calculadas e premeditadas.
Por entre as últimas hastes podemos descortinar um aspecto desembaraçado sobre uma laguna de savana de alguns centos de metros em comprimento por outros tantos em largura.
A cena da vida animal que ora se apresenta aos nossos olhares é tão grandiosa e imponente que todos permanecemos estupefatos, retendo a respiração, cada um perguntando a si mesmo se o que vê é real ou não será uma "fata morgana" e deslumbramento de algum sonho; [...].
O que ali está em aves do brejo e aquáticas, palmípedes e pernaltas, acumuladas em um espaço relativamente pequeno; tudo o que está ali se enlameando, chapinhando, esgaravatando, bicando, mergulhando, nadando, voando, piando, grasnando, gritando, tudo ao mesmo tempo, num fervet opus incrível, desafia qualquer descrição; diante de tais quantidades é impossível contar e dificílimo mesmo avaliar e todos os recursos da linguagem não são bastante expressivos e brilhantes para dar uma ideia do barulho, da confusão que ali reina.
Algum êxito teria talvez, no que toca à vista, o pincel de um privilegiado pintor de animais, para o qual cada pequeno trecho da paisagem diante de nós formaria um grato assunto para uma tela de real valor". Emílio A. Goeldi (1859-1917). Maravilhas da natureza na Ilha de Marajó (Rio Amazonas). Boletim do Museu Paraense de Historia Natural e Ethnographia (Museu Goeldi). Belém, t. 3, fasc. 1-4, p. 389-390, 1902.
Ilustração de Ernst Lohse (1873-1930). Álbum de Aves Amazônicas - 1900-1906. |
Comentários
Postar um comentário