Um bruto pé-d´água
"O piloto é quem manda na canoa. Decide as pendências e desempata as teimas. Ninguém pode discutir com ele. No melhor da viagem, caiu um bruto pé-d´água. O patrão da navegação tinha avisado: -"Vamos ter uma boa carga d´água. Trovoada ainda está na boca do rio e eu já sinto ela aqui na minha caruara. A junta é sinal certo"... Mal sentiram no lombo os primeiros pingos, os canoeiros começaram a gritar num alarido dos infernos: - "Mandaí! Mandaí! Mãe de Deus! bem grossa e aturada, pra mim e mais vinte camaradas! " A chuva braba fazia um fragoído de tempestade no meio do rio. E o esturvo do trovão abalava a mataria molhada, onde os coriscos, riscando o céu, de vez em quando toravam um pau. Mas quem viaja no inverno está sujeito aos caprichos do piloto. Divisamos de longe, num barranco, a barraca de um seringueiro. - "Vamos amarrar ali, seu piloto?" - "Não, que eu não peço arrancho a peste de seringueiro!" E a canoa encostou na mata bruta onde todos passamos a noite, debaixo das árvores encharcadas, aguentando o açoite da chuva e da ventania, os pés empapados na lama, e nos ouvidos o azucrim dos carapanãs. E de madrugada, dançando no visgo escorregadio do tijuco, descemos todos a barranca, para tomar de novo a canoa e continuar viagem rio abaixo. [...]. Peregrino Junior. A mata submersa e outras histórias da Amazônia. 1960. p. 178.
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