Os músicos da selva


"Em nenhum outro lugar do mundo existem tantas aves canoras como nas florestas. A natureza, aí, é uma orquestra. Seus instrumentos são as lufadas agitadas dos ventos, o tamborilar da chuva, o farfalhar das folhas. Os insetos acompanham em surdina. O baixo é representado pelo coaxar dos sapos. E os solistas são os pássaros canoros.
Raramente existe silêncio completo na mata. Mesmo ao meio-dia, quando a maioria dos animais da floresta se esconde do  sol ainda se ouve o zumbir das abelhas e das moscas de cores álacres, assim como o coro dos sapos.
Quando a névoa matinal começa a ceder lugar aos raios do sol, as vozes das aves penetram a floresta. Os insetos  despertam para a vida. As borboletas, e entre elas as grandes "Morphos", azuis e brancas, batem as asas, vibram as extremidades delas e levantam voo nas sombras das verdes mansões. Os pássaros solistas espertam cantando. Às cinco horas ouve-se a voz de uma pomba, que parece dizer, em nossa língua "Maria, já é dia!" De repente a calma da floresta é ferida pelo som de um sino. É  uma nota tão pura e límpida que todos os que a ouvem ficam certos de que alguém anda a bater um sino do mais melodioso tom. O próprio Orfeu, sem dúvida, deixaria cair sua flauta para escutar tão belo som. Este vem de um pássaro bonito e todo branco, uma araponga, pertencente à família dos Cotingídeos, que também encerra o galo da serra e o pavão da mata.
A araponga, um pouco menor que um pombo doméstico, é toda branca. na parte superior do comprido bico negro existe uma saliência preta, formada por uma peça em forma de clava, que, segundo os índios, fica de pé quando o pássaro entoa o seu canto.
Logo outras aves se reúnem ao coro da mata. Pode-se ouvir, ao longe, o canto do "realejo", de notas tão melodiosas que vocês jurariam  ter entrado na floresta algum tocador de sinfonias. Outro pássaro, que ainda não possui nome, desfia um canto que lembra o som do martelo a bater em prego: "peng-peng-peng!".
Durante o dia há um verdadeiro desfile de pássaros, cada qual entoando um canto todo seu. São os "surucuás" bronzeados e de tintas vermelhas, as "ciganas" e as rubras "guarás", ou "ibis". São os mutuns de cor preta lustrosa, os perus da selva. Garças brancas, como fantasmas,ou cinzentas. Também desfilam patos, pica-paus, tangarás,ferreiros e pombas. Todas essas aves despertam com o cantar dos músicos da selva. [...]". Victor W von Hagen (1908-1985). Animais da América do Sul. [195?]. p. 97-100.


Surucuás.
DESCOURTILZ, Jean Theodore Ornithologie Bresilienne Ou Histoire Des Oiseaux Du Brésil, Remarquables Par Leur Plumage, Leur Chant Ou Leurs Habitudes.[1852-1856].
www.biodiversitylibrary.org

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