Jacitara, uma palmeira que se transforma

        Um olhar na selva amazônica, sobretudo na da várzea, mais densa e escura que a da terra-firme, revela a ânsia dos dois reinos para os cimos, como se fugissem horrorizados da penumbra. Porque a floresta da pátria das aluviões é sem dúvida profundamente sombria, mal deixando passar no crivo da sua cabeleira verde um ou outro raio luminoso. A natureza então arma os seus representantes, vegetais e animais, de órgãos suplementares para a subida. E a caminhada rumo do alto no aperto silvestre de mil espécies arbóreas, traduz-se por uma luta formidável, de girafas botânicas, a espicharem o pescoço para cima. O açaí chumbo (Euterpe catinga Wall.), por exemplo, que é o açaizeiro da terra-firme, e vive isolado na floresta, afina-se, adelgaça-se, estira-se, alcançando comprimentos imprevistos na fúria de subir ao lado dos príncipes dos bosques. Isto somente para que o seu espanador verde se agite ao vento das franças acariciadas pelo sol. E tanto se espicha o representante das euterpias nesse conflito, que, roçada a mata que lhe fica em torno, perdido portanto o amparo das gigantescas essências derrubadas, o açaizeiro verga, tomba e quebra-se. A jacitara é outra palmeira que se transforma para a volúpia de ir beber o éter ao nível das copas altas. Aparelha-se de acúleos e sobe pelo fuste do vizinho próximo. Espinho aqui, espinho ali, mordendo a casca da árvore à qual aderiu, ganha as cumiadas.

FONTE:

MORAIS, Raimundo. Amphitheatro amazônico. São Paulo: Melhoramentos, 1936. p. 152.


Jacitara. Desmoncus orthacanthos
 J. Barbosa Rodrigues. Sertum palmarum brasiliensium, v. 2, t. 54, 1903.
www.plantillustrations.org


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